sábado, 27 de junho de 2015

A boniteza da vida


Contou-me certa vez um menino, que os seus olhos só viam coisas belas. Nenhuma tristeza possível lhe parecia feia. Olhava com certa magia e sempre encantava-se com algo.
O menino sentou-se ao meu lado, colocou a mão sobre meu joelho e indagou sobre qual a cor mais feia para mim. Respondi sem pensar: o cinza, a cor da tristeza. O menino abriu um lindo sorriso e disse-me:
-Você já pensou que o cinza é uma cor essencial para todos?
Respondi rapidamente:
-Para mim, poderia nem existir!
-Como assim?-insistiu o menino entusiasmado. -O cinza faz parte da vida. Quando o céu fica cinza, vem chuva. A chuva faz bem pra todos. Água é vida. Logo o cinza é vida.
-Ah!-soltei um suspiro e não quis continuar o assunto.
Fiquei quieta por um instante. Ele apontou pra minha face e disse:
-Esta aguinha que cai dos teus olhos é vida também. É água. Água é vida.
Enxuguei a lágrima que insistia em não ficar no olho (que raiva). Por que a tristeza não ficava guardada lá dentro da gente. Tinha que se manifestar... Tinha que brotar assim, repentinamente dos olhos da gente...E agora este menino do meu lado, dizendo que tudo que  que se referia a água era vida....Já estava ficando sem paciência. Disse-lhe:
-Pronto... A água que caia do meu olho, já não existe mais. Matei a vida!!! Não foi?
O menino olhou-me meio surpreso, mas com um leve sorriso. Falou-me baixinho:
-Que bobagem!Ninguém mata uma lágrima!
Senti-me meio idiota. Resolvi mudar o assunto:
-Então me diga qual cor você acha mais feia?
O menino pensou, pensou e respondeu somente quando perguntei novamente:
-A que eu acho menos bonita é a branca.
Ah, peguei o danadinho!
-Branco não é cor. Na verdade é uma ilusão, pois é a mistura de todas as cores!
-Por isso mesmo! Não saberia escolher uma. Gosto de todas. Então prefiro deixar as coisas feias, somente na ilusão, porque na vida a gente tem que ter olhos de beleza. A gente tem que saber olhar. Olhar com a alma e enxergar em algum cantinho de cada coisa a beleza que está lá.
Olhei aqueles olhos brilhantes, o sorriso franco e afaguei-lhe a cabeça.
Ele levantou-se, arrancou uma tímida florzinha que nascera entre o cimento do canteiro e falou-me:
-Vê esta flor? Nasceu onde não deveria, nem por isso deixou de ser bela, porém ninguém observa sua beleza, pois não esta junto das outras no canteiro, mas vês como ela é forte? Veio enfeitar onde não havia beleza alguma. Que valor tem esta florzinha pra ti?
Fitei o menino sem saber o que responder.
-Planta-a no teu jardim. Se acreditares que ela dará mais flores ela assim te responderá. Se não acreditares ela perecerá e morrerá e não enfeitará nem teu jardim, nem mais o cimento onde estava.
Com um gesto singelo beijou a flor e me deu.
Agradeci com um sorriso meio sem graça.
Olhei para aquela florzinha tão frágil e tão forte ao mesmo tempo. Levantei-me rapidamente. Precisava plantar logo minha flor. Não podia perder tempo. Sabia que aquela era a primeira de muitas flores que plantaria na minha vida.
Nunca mais vi o menino de olhos brilhantes, mas quando não estou conseguindo ver a boniteza da vida em alguns momentos, lembro da sua imagem e então olho meu jardim e renovo meu olhar e encontro múltiplas beleza em cada cantinho do caminho que sigo constantemente sem nunca parar.


Zana Ol