quinta-feira, 31 de janeiro de 2013

Semeadura





Não me restam segredos
Levaste sentimentos
Cruéis, impuros, insensatos.

Rastreaste meus cantos
Colhendo minhas pequenas
Descobertas guardadas
Nas sombras
De pensamentos
Reclusos

Não me restam saudades
Levaste todas contigo
E deixaste somente
O rastro

Não me resta melancolia
Pois a substituíste
Por enternecimento.

Nos cantos escuros
Colocaste estrelas
Varreste os vestígios da tristeza
E deixaste flores de alegrias

Não me restam sementes
Pois no jardim que preparaste,
No solo antes infértil
Nasceram flores e lindos amores.

Zana Ol





quarta-feira, 30 de janeiro de 2013

Estações


     

       Desde que se entendia por gente conhecera-a assim. Havia dias em que ao vê-lo abria um sorriso do tamanho do mundo e afagava seus cabelos com um carinho como só ela sabia fazer. Em outros seu olhar ultrapassava-o. Falava com ele como se fosse um estranho. Nesses dias ele sentava-se ao seu lado e ficava lá compartilhando o seu silêncio.
      Não sabia ao certo o que acontecia. No alto da sua infância, não conseguia entender o que se passava na cabeça dela, mas sabia que algo o prendia a ela. Afinal todo mundo dizia: “Esse menino é a cara da avó. Tem até esse jeito esquisito de enxergar o mundo. Às vezes olhos alegres outras vezes tão longe que parece que vão para outro planeta. Vai saber.”
      E o menino não entendia nada. Só sabia que quando chegava perto, sentia um calor gostoso, tão confortante que ficaria ali por horas, mesmo quando ela parecia estar em outro planeta...
      Nos dias em que sua avó olhava o mundo  com encantamento (ela dizia isso), ria das suas palhaçadas, até dos seus tropeços na rua. Comprava flores para enfeitar a casa, e à tardinha, sentava-se na varanda e pedia para que ele contasse-lhe uma história. Nos dias quem que a avó comprava margaridas, então se preparava o menino, pois as histórias seriam complementadas pela imaginação fértil daquela doce velhinha. As histórias ficavam longas e encantadoras, misturavam realidade e fantasia. Na verdade eram dois autores inventando as mais malucas histórias. E todas com finais felizes. Quando terminavam, riam-se, até  doer a barriga.
      Nos dias em que seu olhar vagava pelo nada, não havia jeito. O vaso ficava vazio e ,se alguém colocasse flores nele, ela as tirava. Não deixava abrir as cortinas, mas no final da tarde sentava-se na varanda e então seu olhar ganhava o horizonte. O menino ao lado, olhava também e contemplava aquele imenso céu. Às vezes ela pousava sua mão no braço dele e assim ficavam. Ele sentia um calorzinho gostoso e permaneciam assim por um bom tempo.
      Foi assim por alguns verões. Então certo dia quente, não se lembrava, se era janeiro ou fevereiro, reuniram-se todos na casa.O menino sabia apenas que iriam decidir algo importante, pois todos os filhos, noras e netos estavam lá. E todos com cara de “inverno”. A avó sentada na varanda olhava o infinito. Ele chegou, deu-lhe um abraço, pegou a almofada e sentou-se ao seu lado.
A avó virou-se e perguntou-lhe: “- Queres vir comigo?” -Surpreso o menino respondeu sem pestanejar: -Quero sim!
      Então  os dois levantaram-se ,ela ajeitou o vestido colheu duas margaridas no jardim ,estendeu uma para o menino   e disse-lhe bem baixinho: “Só você conhece minhas alegrias e minhas tristezas, meus verões e meus invernos. Agora é preciso ir mais adiante...”
      O menino olhou em seus olhos e viu algo diferente, parecia que uma nova estação emanava daquele doce olhar, talvez começasse ali a tão esperada primavera  ou quem sabe um outono? Não soube definir, então lhe lançou um sorriso e carinhosamente pegou a pequena  mão macia e morna e foram-se pelo caminho deixando para trás tantos verões e tantos frios invernos.

      Zana Ol

quarta-feira, 16 de janeiro de 2013

Desfecho


     

      Levantou-se ajeitou a blusa, arrumou os cabelos e seguiu. Caminhou até a lixeira, amassou o pequeno papel e colocou lá dentro com toda força.
      Ficou olhando por um tempo, talvez para ter certeza que ele ficaria lá dentro. Era lixo e era ali o seu lugar.
      Olhou a sua volta. O sol insistia em brilhar em um céu sem nuvens.
      Quente. Muito quente. O suor escorria-lhe pelo rosto e confundisse com as lágrimas. Já não as sentia mais. Com o braço limpou-as, mas seu rosto permanecia molhado.
      A parte pior coubera-lhe. Jogar no lixo as suas histórias. Todo amor precisa de liberdade. Então o libertava.
      Caminhou por entre inúmeros rostos. Desviou de alguns, mas outros esbarraram seus olhos nos seus. Estava despida, podiam ver sua alma, sua dor, seu lamento. Nenhum amor é grande o suficiente para abarcar a mais íntima solidão.
     Percorreu a infinita rua, virou a esquina.   Não olhou mais para trás. Olhos fixos no horizonte.
Foi-se. Afinal, o amanhã lhe traria outro dia, outros sonhos, outras possibilidades, e porque não, outros amores?

Zana Ol


segunda-feira, 14 de janeiro de 2013

Silêncio




Não,
Não falo mais
Dói-me a alma
Tantas indiferenças

Não ,
Não falo mais
Calou-me a voz
Estancou meu grito
Na garganta

Não,
Não falo mais
escutem agora
Apenas meu silêncio.

Zana Ol