Respirou fundo, deu mais dois passos e sentou-se, como já fazia há algum tempo. Sentou na mesma cadeira que tão bem acomodava seu corpo cansado. Pegou o livro que repousava mansamente na cadeira ao lado, cadeira que permanecera ali, mesmo depois de tudo. Servia-lhe para pousar o livro e rastrear suas lembranças.
Olhou ao seu redor, sentiu um conforto imenso, pois tudo lhe era extremamente familiar: os lírios plantados na floreira ao lado da porta, as roseiras... Ah as roseiras, que perfume exalava nesta época. Um cheiro que toca a alma e nos permite viajar no tempo. Havia também à sua frente a enorme mangueira, que plantaram a quatro mãos. Ela fora generosa e o presenteava com sobra e lembranças...
Então se permitiu fechar os olhos, sentiu a brisa morna tocando seu rosto e trazendo junto as lembranças. Não era difícil lembrar-se, pois os acontecimentos sempre foram infinitamente atemporais. Lembrou-se da música, das estrelas e da figura que tanto rodeava sua mente.Era bom lembrar. Então se viu, naquele imenso salão. Pessoas rindo, conversando, barulho de copos, risos... era tudo tão presente... A viu ali, no seu vestido rosa esvoaçante, cabelos soltos e negros como a noite tocando-lhe a cintura, pele clara e olhos amendoados, sorrindo. Ela tinha estrelas nos olhos e um jeito doce de sorrir, mas foi quando sua mão tocou-lhe pedindo licença para sentar-se ao seu lado que ele percebera que aquela mão o acompanharia por toda sua vida. E assim foi. Jamais esquecera seu sorriso, jamais esquecera seu toque, jamais esquecera seus lábios tocando os seus, jamais esquecera quando juntos sentavam na mesma varanda e fechavam os olhos sentindo a brisa acariciar-lhes os rostos e ouvia a voz suave dizendo-lhe ao ouvido: - Um dia voaremos juntos, seguiremos o vento e nossas mãos entrelaçadas entrelaçarão nossas almas e então seremos um só, corpo e alma!
Era bom ouvi-la, era bom tê-la, era bom sentir seu toque...
Não, não estava triste, como muitos imaginavam quando o viam sentado na varanda ao lado da cadeira vazia e segurando aquele velho livro já amarelado pelo tempo e gasto pelas inúmeras releituras que fazia diariamente. Ele sorvia cada palavra que ela escrevera em forma de versos, pois sabia que era o mais precioso que poderia ter dela agora e sempre.
Não, não estava triste, sabia que em todos os entardecerem que ainda estavam por vir ela estaria ali, nos lírios, nas roseiras, na árvore, na brisa que insistia em beijar-lhe a face e tocar-lhe a alma.
Não havia tristeza, apenas a certeza que logo voariam juntos seguindo o vento, seguindo a vontade, seguindo o destino...
Zana Ol